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2 de Maio de 2024
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    A justiça não é igual para todos

    há 15 anos

    Antonio Carlos de Oliveira

    Jornalista, Mestre em Comunicação pela UPAP (México)

    O Judiciário brasileiro trata mal os pobres – especialmente os negros – e tem resistência em cumprir a função que a Constituição Federal lhe atribuiu. Vários estudos demonstram que o acesso à Justiça no Brasil não é igual para todos e que a raça e o nível social podem influenciar nos resultados dos processos judiciais, criando dificuldades para que práticas racistas sejam exemplarmente punidas.

    O Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil, elaborado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) – que analisou o andamento de vários casos de racismo e discriminação racial no Tribunal de Justiça do Maranhão e em outras doze Cortes Estaduais – aponta que 40% dos processos de acusação por prática racista tiveram os méritos considerados improcedentes pelos juízes na primeira instância.

    O relatório mostra que na medida em que a tramitação de um processo que envolve crime de racismo avança, a situação se inverte. Na segunda instância, durante a análise das decisões dos desembargadores, os réus das ações por crime de racismo passam a levar vantagem, alterando as decisões de primeiro grau, até então vencidas, na maioria das vezes, pelas vítimas. Ao todo, 57,7% dos réus acusados de racismo ganham as ações na segunda instância. Apenas em 32,9% dos casos as vítimas foram vencedoras.

    Numa análise sobre a aplicação da legislação nacional de combate à discriminação, verifica-se a inexistência de condenações pela prática de racismo e injúria racial. Não é de hoje que o Judiciário trata de forma inadequada a questão do racismo. Dados oficiais indicam que crimes idênticos cometidos por negros e brancos têm tratamento e resultados diferentes.

    O Judiciário caminha em descompasso com a legislação anti-racista. Mesmo com o avanço do arcabouço legal, estimulado pela Constituição de 1988, a Justiça não está sendo capaz de garantir a punição para aqueles que cometem crimes de racismo, uma vez que nos julgamentos prevalece mais os posicionamentos pessoais do que a lei, um indicativo de que os juízes absorveram valores de setores equivocados da sociedade que ainda alimentam forte preconceito e lidam muito mal com a questão do racismo

    O cenário de marcantes desigualdades sociais construídas sob forte influência do racismo, exige que Justiça adote um outro posicionamento nas questões que envolvem conflitos em que os negros denunciam o desrespeito aos seus direitos constitucionais.

    Desde a Constituição de 1988, o racismo é considerado crime inafiançável. Alterações em 1989 e em 1997 à chamada Lei Caó – em homenagem ao autor do projeto, o então deputado, Carlos Alberto Caó – tornaram as punições mais rígidas. As penalidades – que eram de um a seis meses – passaram a ser de um a cinco anos de reclusão.

    Na medida em que as demandas aumentam, o caminho natural é a criação de jurisprudências (conjunto das decisões e interpretações das leis feitas pelos tribunais superiores, adaptando as normas às situações de fato), seguidas do fortalecimento da legislação e dos dispositivos jurídicos que direcionem o tratamento dos casos de racismo.

    Não seria exagero afirmar – os dados estão aí para comprovar – que o Judiciário vem negligenciando nas questões que envolvem o racismo, se negando a manter um estreito diálogo com os tratados e convenções internacionais que versam sobre o tema, não fazendo o menor esforço para que os princípios que impulsionam e fomentam a igualdade sejam incorporados ao fazer jurídico brasileiro.

    Nesse contexto, torna-se necessária uma mudança de postura do Judiciário, visto que a evidente parcialidade no julgamento dos processos que tratam de crimes de racismo coloca em xeque a sua legitimidade para atuar como protagonista na concretização da cidadania no país.

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